21 de jun. de 2012

Análise: Líderes têm na mão um texto sem narrativa e sem alma


A superficialidade é a contrapartida da excessiva abrangência. Assim, parece inevitável que diante de tão grande quantidade de temas (água, mulheres, clima, financiamento, inovação, governança, economia verde) o documento que os chefes de Estado reunidos para a Rio+20 têm sob os olhos só possa indicar, em cada assunto ao qual se volta, linhas genéricas.

Mas o problema do texto não é o excesso de temas. É a falta de narrativa. Na sua ausência, o resultado só pode ser este: um conjunto sem alma, que reitera a cada passo o compromisso com o passado (citando sempre declarações e tratados anteriores), mas se mostra totalmente incapaz de colocar-se no caminho do futuro. Um melancólico reflexo da ausência de liderança global.

No cerne do que deveria e poderia ser esta narrativa estão os dois mais importantes desafios das sociedades contemporâneas. O primeiro é o combate à miséria absoluta. Os recursos para uma espécie de bolsa-família universal existem e o Brasil chegou a propor que esta fosse uma das decisões da Rio+20. A ideia simplesmente não entrou no documento que os chefes de Estado começam a discutir.

Mas o segundo desafio é que o sucesso durável no combate à miséria depende de um outro lado da moeda: não é mais possível, no mundo de hoje, avançar na luta contra a pobreza se não houver redução das desigualdades. E esta redução não virá apenas de melhorias nos padrões de vida dos mais pobres.

Ela supõe drástica diminuição dos excessos que marcam o uso dos recursos por parte dos que estão nos andares de cima da pirâmide social. E não só nos países desenvolvidos. Sobre isso, o documento é pateticamente mudo.
As Nações Unidas, as grandes consultorias globais e várias ONGs produziram documentos recheados de diagnósticos e propostas para a Rio+20. O texto que os governantes têm em mãos não faz jus à riqueza deste extraordinário processo de mobilização. Mas ainda há um dia para que o jogo mude

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